– Eu! Eu sou o elefante africano.
– Ah! Com essa elegância asiática, não te diria de África, mas olhando bem talvez, de perfil tens traços indianos e vendo essas orelhas… sim, pode ser!
Este é o tipo de conversa que poderia considerar razoável. No mundo dos elefantes, as pequenas diferenças estão de facto nas orelhas e nos marfins (o africano é maior do que o asiático ou indiano, como é conhecido). E no nosso mundo?
África, ou ser africano, está na moda por esta Europa fora. Dependendo, é claro, do tal africano. Convém ser artista, modelo ou futebolista: se não couberes dentro dessa bolha chamada status, cais no lado marginal do imigrante, e aí estás fodido.
Feições indianas, cabelo de africana, pele de europeia. Blá! Blá! Blá!…
– O meu editor vende-me como angolano/africano, e não como português, porque é menos sexy: Kalaf Epalanga, há dias na Feira do Livro do Porto, num debate com Telma Tvon, moderado por Sheila Khan, um painel todo ele africano (ou europeu?) perante uma plateia maioritariamente europeia.
Por que é que temos de ter estes rótulos?
Por que é que primeiro temos de passar por essa aprovação?
– De onde és?
– Português
– Já nasceste cá? E os teus pais?
Recentemente voltei a Moçambique, e, com esta pronúncia tuga que fui ganhando pelos muitos anos que levo daqui, tive de mostrar o meu BI para provar que era moçambicano.
Naquele momento, veio-me à cabeça algo como “fui deserdado”. Pensei como é difícil para todas as pessoas que tentam entrar, mudar, experimentar ou respirar outros mundos diferentes do que alguém (sabe-se lá quem) apelidou de “normal”, e que de repente, aos olhos dos outros, ficam na terra de ninguém. Termos sempre de escolher o lado da barricada em que ficamos é lixado.
Há uns anos tive de enfrentar este tema com os meus filhos pela primeira vez.
– Pai, afinal nos somos o quê?
Expliquei que eram um misto do pai e da mãe, e por isso tinham entre outras aparências aqueles cabelos lindos: a combinação do caracol do cabelo do pai e do fio liso da mãe, repetidamente, de forma contínua, resultando numa espiral.
É triste ouvir falar de certos inquéritos nas escolas, mas não é à volta disso que me apetece estar aqui a deambular. Não quero ter de concluir que o lugar de onde vêm chavões como “não sou racista, tão depressa aperto a mão a um branco como o pescoço a um preto” ainda cá está.
Saímos da selva onde ficaram os elefantes há muitos anos, mas mesmo domesticados somos dados à luta. De galos.
E tu, de onde és?
josesergioSeptember 20, 2018Quotidiano0 comments
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My love in Moçambique
December 15, 2017 0 commentsSim! Gosto do conceito! Sim! E o meu Moçambique é escusado dizer que amo, como -
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